A pesca, praticada pelos índios, é uma atividade anterior à chegada dos navegadores portugueses ao Brasil, e peixes, crustáceos e moluscos eram parte importante de sua dieta alimentar. Os inúmeros sambaquis, depósitos de conchas encontrados em sítios arqueológicos ao longo do litoral atestam a importância da atividade da pesca e coleta.
Jean de Léry, calvinista, estudioso de teologia que em meados do século XVI participou da tentativa colonizadora francesa no Rio de Janeiro, descreve com detalhes a pesca praticada pelos índios Tupimbás. Ao longo do litoral, esses indígenas usavam canoas, pirogas cavadas em tronco de árvore e também piperis (igapebas), jangadas feitas de paus amarrados, ambas embarcações utilizadas na pesca litorânea.
Terminando, direi, ainda, a respeito do modo de pescar dos tupinambás, que além das flechas usam também espinhas à feição de anzóis, presas a linhas feitas de uma planta chamada tucom. Também penetram no mar e nos rios tem jangadas, a que chamam piperis: são feitas de cinco ou seis paus redondos. Quando o tempo está bom e os selvagens pescam separadamente, parecem de longe, tão pequenos se vêem, macacos ou melhor rãs, aquecendo-se ao sol em achas de lenha soltas na água... (Léry 1941:148-149).
Além disso, Jean de Léry surpreendia-se com a facilidade com que os indígenas pescavam com as redes trazidas pelos europeus: “Se porventura os deixávamos manejar as redes, revelavam grande habilidade” (Léry 1941: 149).
Ainda no período colonial, além da pesca indígena de subsistência, organizou-se a pesca da baleia, que se constituía num monopólio da Coroa Portuguesa (Ellis 1969). A concessão dessa pesca era dada a pescadores portugueses e bascos. A mão-de-obra utilizada na captura da baleia era constituída sobretudo por escravos africanos (Langesdorf 1996), muitos dos quais negros libertos, sobretudo a partir do início do século XIX (Silva 1996).
A importância dessa pesca era grande, sobretudo na Bahia, no litoral sul de São Paulo (Ilha do Bom Abrigo) e litoral de Santa Catarina, onde ainda hoje podem ser vistos os vestígios das diversas armações. A pesca da baleia somente terminou nos anos 70 com a desativação da empresa japonesa em Cabedelo (Paraíba), embora todas as armações baleeiras existentes tivessem terminado suas operações no litoral brasileiro em meados do século XIX, como resultado da competição com pescadores norte-americanos.
A atividade pesqueira deu origem a inúmeras culturas litorâneas regionais ligadas à pesca, entre as quais podem ser citadas: a do jangadeiro, em todo o litoral nordestino, do Ceará até o sul da Bahia; a do caiçara, no litoral entre o Rio de Janeiro e São Paulo; e o açoriano, no litoral de Santa Catarina e Rio Grande do Sul. Enquanto esses dois últimos tipos de pescadores estavam também ligados à atividade agrícola, os primeiros dependiam quase inteiramente da pesca costeira.
Nas primeiras décadas do século XX, a atividade pesqueira, antes vinculada à pequena produção assumiu, em algumas regiões, uma escala comercial de grande importância, como é o caso da pesca da sardinha por barcos que usavam uma grande rede de cerco, chamada de traina. Daí o nome de traineiras dado a essas embarcações, que começaram a pescar na Ilha Grande (Rio de Janeiro) e foram introduzidas pelos portugueses e espanhóis, utilizando uma tripulação de 15 a 20 homens. A primeira dessas redes foi introduzida por um pescador espanhol, que a trouxe pronta de seu país, por volta de 1910 (Bernardes 1958, Brito 1960).
Além dessa atividade pesqueira, realizada principalmente no litoral entre São Paulo e Rio de Janeiro, destacou-se também nas primeiras décadas do século XX a pesca realizada pelos descendentes dos pescadores açorianos que tinham chegado em meados do século XVIII para colonizar o extremo sul do Brasil, naquela época sob ameaça espanhola.
A pesca da sardinha, realizada em grande escala, deu origem também às primeiras indústrias de salga e secagem (depois enlatamento) no Rio de Janeiro e Santos, ao passo que as indústrias pesqueiras do Rio Grande do Sul, surgidas nas décadas de 20-30, processavam principalmente a merluza.
Na década de 60, o governo brasileiro decidiu implantar uma indústria pesqueira em base empresarial, através de incentivos fiscais concedidos pela recém-criada Superintendência do Desenvolvimento da Pesca – Sudepe. A maioria dessas empresas foi criada, sobretudo no litoral centro-sul do Brasil, usando trawlers na captura do camarão para a exportação (Diegues 1983). Algumas dessas empresas foram criadas no Ceará, para a captura da lagosta. Nesse processo, surgia também um proletariado ligado à pesca e ao beneficiamento do pescado, em contraposição à pequena pesca artesanal, baseada no modelo de companha própria da pesca ibérica, de onde também se trouxe as “colônias de pescadores”, modelo de organização dos pescadores introduzido por volta de 1922 e semelhante às guildas espanholas.
A pesca industrial/empresarial teve seu auge na década de 70, passando por uma grave crise na década de 80, quando a maioria das indústrias fechou suas portas. Uma das causas principais dessa crise foi a rápida sobrepesca dos bancos de camarão e algumas espécies de peixes, além da recessão econômica que limitou o aporte dos recursos financeiros conseguidos facilmente pelas empresas. Uma parte das empresas pesqueiras do sul acabaram se transferindo para o litoral amazônico, sobretudo entre Pará e Maranhão, onde continuam explorando os bancos de camarão.
Jean de Léry, calvinista, estudioso de teologia que em meados do século XVI participou da tentativa colonizadora francesa no Rio de Janeiro, descreve com detalhes a pesca praticada pelos índios Tupimbás. Ao longo do litoral, esses indígenas usavam canoas, pirogas cavadas em tronco de árvore e também piperis (igapebas), jangadas feitas de paus amarrados, ambas embarcações utilizadas na pesca litorânea.
Terminando, direi, ainda, a respeito do modo de pescar dos tupinambás, que além das flechas usam também espinhas à feição de anzóis, presas a linhas feitas de uma planta chamada tucom. Também penetram no mar e nos rios tem jangadas, a que chamam piperis: são feitas de cinco ou seis paus redondos. Quando o tempo está bom e os selvagens pescam separadamente, parecem de longe, tão pequenos se vêem, macacos ou melhor rãs, aquecendo-se ao sol em achas de lenha soltas na água... (Léry 1941:148-149).
Além disso, Jean de Léry surpreendia-se com a facilidade com que os indígenas pescavam com as redes trazidas pelos europeus: “Se porventura os deixávamos manejar as redes, revelavam grande habilidade” (Léry 1941: 149).
Ainda no período colonial, além da pesca indígena de subsistência, organizou-se a pesca da baleia, que se constituía num monopólio da Coroa Portuguesa (Ellis 1969). A concessão dessa pesca era dada a pescadores portugueses e bascos. A mão-de-obra utilizada na captura da baleia era constituída sobretudo por escravos africanos (Langesdorf 1996), muitos dos quais negros libertos, sobretudo a partir do início do século XIX (Silva 1996).
A importância dessa pesca era grande, sobretudo na Bahia, no litoral sul de São Paulo (Ilha do Bom Abrigo) e litoral de Santa Catarina, onde ainda hoje podem ser vistos os vestígios das diversas armações. A pesca da baleia somente terminou nos anos 70 com a desativação da empresa japonesa em Cabedelo (Paraíba), embora todas as armações baleeiras existentes tivessem terminado suas operações no litoral brasileiro em meados do século XIX, como resultado da competição com pescadores norte-americanos.
A atividade pesqueira deu origem a inúmeras culturas litorâneas regionais ligadas à pesca, entre as quais podem ser citadas: a do jangadeiro, em todo o litoral nordestino, do Ceará até o sul da Bahia; a do caiçara, no litoral entre o Rio de Janeiro e São Paulo; e o açoriano, no litoral de Santa Catarina e Rio Grande do Sul. Enquanto esses dois últimos tipos de pescadores estavam também ligados à atividade agrícola, os primeiros dependiam quase inteiramente da pesca costeira.
Nas primeiras décadas do século XX, a atividade pesqueira, antes vinculada à pequena produção assumiu, em algumas regiões, uma escala comercial de grande importância, como é o caso da pesca da sardinha por barcos que usavam uma grande rede de cerco, chamada de traina. Daí o nome de traineiras dado a essas embarcações, que começaram a pescar na Ilha Grande (Rio de Janeiro) e foram introduzidas pelos portugueses e espanhóis, utilizando uma tripulação de 15 a 20 homens. A primeira dessas redes foi introduzida por um pescador espanhol, que a trouxe pronta de seu país, por volta de 1910 (Bernardes 1958, Brito 1960).
Além dessa atividade pesqueira, realizada principalmente no litoral entre São Paulo e Rio de Janeiro, destacou-se também nas primeiras décadas do século XX a pesca realizada pelos descendentes dos pescadores açorianos que tinham chegado em meados do século XVIII para colonizar o extremo sul do Brasil, naquela época sob ameaça espanhola.
A pesca da sardinha, realizada em grande escala, deu origem também às primeiras indústrias de salga e secagem (depois enlatamento) no Rio de Janeiro e Santos, ao passo que as indústrias pesqueiras do Rio Grande do Sul, surgidas nas décadas de 20-30, processavam principalmente a merluza.
Na década de 60, o governo brasileiro decidiu implantar uma indústria pesqueira em base empresarial, através de incentivos fiscais concedidos pela recém-criada Superintendência do Desenvolvimento da Pesca – Sudepe. A maioria dessas empresas foi criada, sobretudo no litoral centro-sul do Brasil, usando trawlers na captura do camarão para a exportação (Diegues 1983). Algumas dessas empresas foram criadas no Ceará, para a captura da lagosta. Nesse processo, surgia também um proletariado ligado à pesca e ao beneficiamento do pescado, em contraposição à pequena pesca artesanal, baseada no modelo de companha própria da pesca ibérica, de onde também se trouxe as “colônias de pescadores”, modelo de organização dos pescadores introduzido por volta de 1922 e semelhante às guildas espanholas.
A pesca industrial/empresarial teve seu auge na década de 70, passando por uma grave crise na década de 80, quando a maioria das indústrias fechou suas portas. Uma das causas principais dessa crise foi a rápida sobrepesca dos bancos de camarão e algumas espécies de peixes, além da recessão econômica que limitou o aporte dos recursos financeiros conseguidos facilmente pelas empresas. Uma parte das empresas pesqueiras do sul acabaram se transferindo para o litoral amazônico, sobretudo entre Pará e Maranhão, onde continuam explorando os bancos de camarão.
Antonio Carlos Diegues.
Este artigo assinala a importância das ciências sociais sociais, particularmente da sociologia, da antropologia, da história e da geografia na análise das comunidades de pescadores ao longo do litoral brasileiro.